Novo Ofício da CVM impõe limitações a ofertas restritas de cotas de fundos de investimento

O entendimento da Superintendência de Registro de Valores Mobiliários – SRE sobre período de lock-up e realização de ofertas concomitantes com esforços restritos impõe limitações às ofertas restritas de determinados valores mobiliários, em especial, as cotas de fundos de investimento. Esse entendimento foi divulgado, em 6 de março, por meio do Ofício-Circular nº 01/2017/CVM/SRE, que traz a interpretação da SRE em relação a uma série de disposições normativas da CVM.

O artigo 9º da Instrução CVM nº 476/09 veda a realização por um mesmo emissor de uma nova oferta pública, com dispensa de registro, por um período de quatro meses a contar do encerramento de uma oferta com esforços restritos de valores mobiliários da mesma “espécie”, período conhecido como lock-up. Nas ofertas distribuídas com esforços restritos, os valores mobiliários podem ser ofertados a, no máximo, 75 investidores profissionais, sendo que, desses investidores, apenas 50 podem adquirir os valores mobiliários ofertados. Assim, a justificativa da CVM para o período de lock-up seria impedir que ofertas restritas – que são automaticamente dispensadas de registro na CVM – da mesma “espécie” de valores mobiliários fossem realizadas de forma sucessiva, alcançando um número de investidores além dos limites permitidos pela norma.

A SRE adotou, no novo Ofício-Circular, uma interpretação restritiva do conceito de “espécie”, entendendo que a alocação dos valores mobiliários em “espécies” diferentes decorreria estritamente de previsão legal ou regulamentar, como no caso das ações e das debêntures. Os valores mobiliários que as normas legais e regulamentares não distinguem em “espécies”, mas tão somente em emissões, classes e/ou séries, seriam de “espécie” única e, desse modo, estariam sujeitos ao período de lock-up estabelecido no artigo 9º da Instrução CVM nº 476/09.

O posicionamento da SRE, embora coerente do ponto de vista técnico, impõe limitações à realização de ofertas restritas de valores mobiliários que não sejam classificados em “espécies” por lei ou regulamentação, como as cotas de fundos de investimento, mas que seriam legítimas ao se considerar os objetivos da norma. A diferença entre cotas de classes diversas, como as cotas seniores e subordinadas de um FIDC, por exemplo, tanto da perspectiva jurídica como econômica, pode ser tão ou mais significativa do que a verificada entre debêntures de espécies distintas, o que faz com que essas classes de cotas sejam destinadas, frequentemente, a públicos distintos no que se refere à tolerância a risco e aos objetivos em relação a retorno. A imposição do período de lock-up entre as ofertas dessas classes, por esse motivo, não parece justificável.

Seguindo o entendimento da SRE, a única exceção à regra do período de lock-up para valores mobiliários da mesma “espécie” seria a realização de ofertas concomitantes. O Ofício-Circular, no entanto, também restringiu o alcance dessas ofertas. De acordo com a SRE, ofertas restritas de dois ou mais valores mobiliários da mesma “espécie”, realizadas simultaneamente, não seriam sujeitas ao período de lock-up, porém, estariam limitadas, de forma agregada, ao número máximo de investidores previsto na Instrução CVM nº 476/09. Exclusivamente para fins dessa limitação, portanto, tais ofertas seriam consideradas como uma só.

O objetivo dessa interpretação da SRE parece claro: impedir que um emissor realize diversas ofertas restritas de valores mobiliários da mesma “espécie”, não se submetendo ao processo de registro na CVM, mas atingindo um número expressivo de investidores. Essa restrição faria sentido se todos os valores mobiliários da mesma “espécie” tivessem características semelhantes e fossem destinados ao mesmo público-alvo. Porém, como já mencionado, nem sempre é esse o caso.

Ainda, tal posicionamento vai de encontro àquele que tem sido historicamente adotado pela CVM para as ofertas simultâneas. No regime ordinário da Instrução CVM nº 400/03, por exemplo, para o registro de ofertas concomitantes, ainda que da mesma “espécie”, a CVM exige que o ofertante trate cada uma delas como uma oferta distinta, obrigando, inclusive, que se recolha uma taxa de fiscalização específica para cada oferta.

A prática de divulgação da interpretação das normas da CVM já vem sendo adotada há alguns anos pela SIN, para os fundos de investimento, e pela SEP, para as companhias abertas. Independentemente de eventuais críticas ao posicionamento manifestado pelo regulador, o fato de a SRE iniciar a adoção dessa mesma política deve ser comemorado. Essa iniciativa contribui de forma sensível para a redução da incerteza jurídica em relação às normas da CVM, o que é fundamental para o desenvolvimento do mercado de capitais no país.

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