O Valor da Multa Contratual

É muito comum que contratos, independentemente do tipo, contenham cláusulas penais, isto é, a obrigação de pagar uma multa convencionada entre as partes e estabelecida no contrato que surge quando uma das partes deixar de cumprir com termos ali previstos.

É fácil perceber a utilidade da cláusula penal no contexto de uma negociação. Normalmente, a principal intenção da parte que pede a sua inclusão em um contrato é assegurar o pontual cumprimento, pela outra parte, da obrigação avençada, por meio do desincentivo ao não cumprimento daquela obrigação, valendo-se, portanto, do poder coercitivo da multa pré-estabelecida.

A cláusula penal também apresenta outras vantagens relevantes para a parte prejudicada pelo descumprimento contratual quando comparada à reparação por perdas e danos, como a dispensa da necessidade de comprovar o dano[1] e a celeridade na sua execução. Por isso, é bastante comum que a outra parte não se oponha à ideia de ter uma cláusula penal prevista em contrato.

A partir desse momento, porém, começam as discussões acerca do conteúdo da cláusula penal, sendo que as mais comuns são aquelas relacionadas ao valor da multa. Nesse contexto, lembramos que o instituto da cláusula penal é regulado pelo nosso Código Civil, nos artigos 408 a 416; ter clareza das regras ali previstas ajudará a balizar essas discussões.

Primeiramente é importante esclarecer que nosso ordenamento jurídico reconhece a existência de dois tipos de multa contratual que se aplicam a situações diferentes e têm diferentes finalidades: (i) a multa compensatória, aplicável no caso de um descumprimento total ou parcial da obrigação principal, visa sobretudo a recomposição da situação patrimonial da parte prejudicada pelo descumprimento contratual, e (ii) a multa moratória, que se aplica no caso de descumprimento no tempo, lugar ou forma convencionados para a obrigação principal, como um atraso, por exemplo, e tem como função incentivar o devido cumprimento daquela obrigação.

Embora ambos os tipos de multa estejam sujeitos ao mesmo limite máximo previsto no Código Civil, que é o valor da obrigação principal[2], por suas naturezas distintas, os valores aplicados às multas compensatórias e às multas moratórias, na prática, terminam por ser bastante diferentes.

Para a multa compensatória, é comum que seu valor seja próximo ou equivalente ao valor da obrigação principal, uma vez que esta não faculta à parte prejudicada exigir ainda o desempenho da obrigação não cumprida ou indenização por eventuais perdas e danos decorrentes do mesmo inadimplemento que causou aquela multa, exceto se convencionado entre as partes de modo diverso. No entanto, havendo previsão contratual nesse sentido, a multa compensatória já estabelecida servirá como mínimo da indenização devida à parte prejudicada. Nesse caso, se o dano incorrido for maior que o valor da multa compensatória, então a parte prejudicada poderá pleitear indenização pelas perdas e danos que excederem a multa, sendo que deverá ser comprovado um efetivo dano que corresponda ao valor adicional pleiteado[3].

Por outro lado, o valor das multas moratórias costuma ser substancialmente menor que o valor utilizado para as multas compensatórias e, na prática, não costuma ser superior a 20% do valor da obrigação principal, pois não têm a pretensão de substitui-la, mas apenas desincentivar o seu inadimplemento. Como regra, a multa moratória não impede que a parte prejudicada exija o adimplemento da obrigação principal ou indenização por eventuais perdas e danos decorrentes do mesmo inadimplemento que causou aquela multa. Por isso, numa eventual discussão judicial, multas moratórias consideradas altas podem ser reduzidas para evitar enriquecimento sem causa da parte prejudicada[4].

Importante lembrar que, por diversos motivos, certos contratos podem não ter um valor da obrigação principal claramente definido. Nesses casos, para aumentar as chances de que a cláusula penal poderá ser executada pela parte prejudicada no futuro, o contrato deve estabelecer de forma clara e pormenorizada a relação entre o valor da multa prevista na cláusula penal e a obrigação principal a que ela se refere, de modo a evidenciar elementos que justifiquem o valor atribuído à multa em questão.

Ao acordarem uma multa contratual, então, é preciso que as partes estejam cientes das principais características desse mecanismo, para que ele seja estabelecido de forma adequada à situação de fato e possa atender à verdadeira intenção das partes.

 

 

[1] Art. 416. Para exigir a pena convencional, não é necessário que o credor alegue prejuízo.

[2] Art. 412. O valor da cominação imposta na cláusula penal não pode exceder o da obrigação principal.

[3] Art. 416. Para exigir a pena convencional, não é necessário que o credor alegue prejuízo.
Parágrafo único. Ainda que o prejuízo exceda ao previsto na cláusula penal, não pode o credor exigir indenização suplementar se assim não foi convencionado. Se o tiver sido, a pena vale como mínimo da indenização, competindo ao credor provar o prejuízo excedente.

[4] Art. 413. A penalidade deve ser reduzida equitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio.

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