O propósito das cláusulas de direito de preferência, tag along e drag along

Nestes últimos meses tivemos no nosso escritório alguns casos em que muito foram discutidas cláusulas de restrições a transferência de ações e quotas em acordos de sócios. Essas discussões nos fizeram debater com nossos clientes e internamente os conceitos e aplicações típicos de restrições de transferências de participações societárias entre sócios, sejam cláusulas de lock-up, direito de preferência, direito de tag along, ou mesmo de drag along.

A primeira característica dessas cláusulas a nosso ver é que, apesar de corriqueiras, raramente são executadas. Não é frequente vermos efetivas alienações de participações societárias sendo feitas por meio do acionamento desse tipo de disposição.

Na prática, essas cláusulas têm por função acima de tudo proteger a manutenção da associação entre os sócios na sociedade investida, fazendo que estes sejam chamados a conversar e negociar caso haja oportunidade e vontade de se fazer qualquer sorte de alienação a terceiro.

E justamente aí está a importância de essas cláusulas serem muito bem escritas e os respectivos direitos e obrigações precisamente delineados. Porque, na prática, elas terminam sendo o que se costuma chamar no âmbito de negociações empresariais como best alternative to a negotiated agreement (“BATNA”, ou melhor alternativa a um acordo negociado). Já houve casos na nossa prática em que clientes nos consultaram querendo entender justamente isso: “se eu não conseguir negociar algo de maneira amigável, o que está a minha disposição no contrato?”.

Neste contexto, as cláusulas de restrição a transferência de participação societária têm esse nível de variedade e detalhamento porque não é possível manter as participações societárias (ações ou quotas de sociedade) permanentemente inalienáveis. A título de exemplo, não é possível estabelecer um lock-up (proibição de venda da participação a terceiro) por tempo indeterminado de maneira irrevogável, tampouco manter por tempo determinado exagerado. Sobre isso, embora não haja jurisprudência ampla a respeito do assunto, a doutrina costuma indicar como aceitável um prazo máximo de cinco anos para lock-up.

Assim, é necessário que se permita a alienação da participação a terceiros, mas é possível impor restrições para que isso ocorra apenas sob determinadas condições e observados determinados procedimentos.

A cláusula mais comum nesse contexto costuma ser o direito de preferência na aquisição de participação societária por um sócio, num evento de possível venda dessa participação por um dos sócios a terceiro não sócio.

Nestes casos, por exemplo, é relevante visualizar a diferença entre o que se costuma chamar de right of first refusal (direito de primeira recusa) e right of first offer (direito de primeira oferta). Na primeira modalidade, é preciso que primeiramente exista uma oferta de um terceiro, para que os demais sócios tenham a preferência para adquirir a respectiva participação nas mesmas condições ofertadas pelo terceiro. Na segunda modalidade, o sócio que desejar alienar sua participação primeiramente pede ofertas aos seus sócios, para depois poder buscar algum terceiro no mercado que eventualmente ofereça condições melhores para a aquisição. Logo, a primeira modalidade tende a privilegiar a manutenção da sociedade com sócios atuais da sociedade, enquanto a segunda modalidade tende a facilitar a alienação a terceiro não sócio.

No que diz respeito ao tag along (ou de direito de venda conjunta), ele é uma disposição que permite que um sócio acompanhe a alienação de participação societária por um outro sócio a um terceiro, geralmente nas mesmas condições. É importante sempre avaliar em quais casos ele deve ser estendido aos demais sócios, caso estes não exerçam sua preferência na aquisição de participação nos termos acima. Caso um acionista tenha participação minoritária que não seja relevante na sociedade, é possível que não faça sentido estender-lhe o direito de venda conjunta em qualquer caso, mas apenas quando houver uma efetiva venda do controle do controle da sociedade.

Mais do que isso, dado que o direito de venda conjunta, nos demais casos, costuma ser aplicável de maneira proporcional às participações dos sócios envolvidos, a descrição da forma de cálculo também passa a ter alguma influência na sua implementação, ao indicar se cabe ao terceiro adquirente adequar a sua oferta para adquirir a soma das participações que os sócios desejem alienar em decorrência do exercício do direito de venda conjunta, ou se cabe aos sócios envolvidos diminuir proporcionalmente a participação alienada por cada um deles de modo a se adequarem à oferta original do terceiro.

Já no caso do drag along (ou direito de venda forçada), ele costuma ser um mecanismo em benefício do acionista majoritário que está no processo de alienar sua participação societária e é exercido em face do minoritário, forçando este a alienar a totalidade da sua participação, aumentando, portanto, a viabilidade da alienação da totalidade das participações a um terceiro adquirente. O principal ponto aqui costuma ser o estabelecimento de um preço mínimo garantido para o minoritário que seja obrigado a vender a sua parte, sendo que eventuais cálculos mais sofisticados para definição desse preço mínimo podem levar a demora ou discussão acerca dele, e assim dificultar ou estabelecer entraves à efetiva execução do drag along.

Por fim, no caso de vendas indiretas de participações societárias por meio de alienação de participações em entidades que façam o investimento direto na sociedade investida, nem sempre os mecanismos acima descritos serão os mais úteis nesses casos, dada a complexidade da estrutura de investimento.

Muitas vezes é mais simples estabelecer a obrigação ao sócio indireto de respeitar um período de lock-up, este obrigar-se a manter o controle da entidade investidora, e de se manter o restante da participação restrito a um determinado círculo de pessoas. Para aumentar a exequibilidade da obrigação, é possível por exemplo o estabelecimento de mecanismos de opções de compra e venda da participação societária na sociedade investida como consequência do descumprimento, desfazendo-se assim a sociedade, a preços de exercício que incentivem o cumprimento da obrigação originalmente assumida.

Por todo o acima exposto, resta bastante claro que há muitas disposições específicas que podem ajudar a delinear as intenções das partes quanto a sua relação no âmbito da sociedade investida, seus planos conjuntos para a sociedade, e em que casos e condições terceiros podem ser admitidos. Com base nisso, eventuais negociações entre as partes são facilitadas e menores são as ineficiências nesses processos. E, em último caso, caso necessário, cláusulas bem escritas e com clareza de intenção darão maior clareza a árbitros e juízes que venham a ter de decidir qualquer controvérsia a respeito do assunto.

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