Cobrança e Guarda de Lastro dos FIDC e as Novas Regras da CVM em Audiência Pública

As regras vigentes aplicáveis aos fundos de investimento em direitos creditórios (FIDC) estabelecem restrições à terceirização das atividades de cobrança ordinária e guarda de documentos comprobatórios e ao recebimento de valores relativos aos créditos em conta que não seja do FIDC. O objetivo principal é se evitar conflito de interesses, em especial com o cedente e suas partes relacionadas. A minuta de norma que foi apresentada na Audiência Pública SDM nº 08/20 (Minuta) sugere a flexibilização de parte dessas restrições, além da normatização de entendimento jurisprudencial relacionado ao tema.

Atualmente, o cedente de créditos a um FIDC somente pode realizar a cobrança daqueles que estejam inadimplidos. A cobrança ordinária é função atribuída ao custodiante do FIDC, não havendo previsão de terceirização dessa atividade. Já o recebimento dos valores relativos aos créditos, inadimplidos ou não, deve ocorrer em conta corrente de titularidade do FIDC, ou em conta vinculada sob o controle ou a fiscalização do custodiante.

A Minuta mantém a possibilidade de o cedente realizar a cobrança de créditos inadimplidos. Porém, autoriza o custodiante a subcontratar prestadores de serviço para auxiliá-lo na cobrança ordinária, desde que não sejam originadores, cedentes, consultores especializados, ou partes a eles relacionadas.

No que se refere à liquidação financeira dos direitos creditórios, para FIDC destinados exclusivamente a investidores profissionais, a Minuta autoriza que o regulamento preveja que tais recursos sejam recebidos pelo cedente em conta corrente de livre movimentação, para posterior repasse ao Fundo. Essa permissão havia sido negada em pedidos de dispensa recentes apresentados ao Colegiado da CVM[1].

Em relação à guarda de lastro, pela regra vigente, o custodiante é responsável por realizá-la, podendo subcontratar terceiros para auxiliá-lo nessa atividade, com exceção do originador, cedente, consultor especializado ou gestor, ou suas partes relacionadas.

A Minuta, por sua vez, estabelece que a responsabilidade pela guarda do lastro é do administrador, que pode contratar o custodiante para realizá-la. Também estabelece, como regra geral, que o custodiante não pode subcontratar originadores, cedentes, consultores especializados ou partes a eles relacionadas para desempenhar essa atividade. A subcontratação do gestor, porém, passa a ser permitida.

A Minuta também permite que o originador e o cedente sejam contratados para realizar a guarda do lastro desde que, entre outras exigências: (a) as cotas do FIDC sejam destinadas a investidores profissionais e não sejam admitidas à negociação, e (b) o FIDC adquira créditos inadimplidos, massificados, de reduzido valor médio e cedidos por baixo percentual do valor de face. O Colegiado da CVM já vinha autorizando a guarda da documentação pelo cedente nas condições descritas acima, tendo inclusive delegado a competência para conceder essa autorização à Superintendência de Investidores Institucionais (SIN), por meio da Deliberação CVM nº 782/17. Desde que os requisitos da norma sejam observados, a Minuta propõe que se estenda também ao originador dos créditos a possibilidade realização da guarda do lastro, e afasta a necessidade de se obter autorização prévia da SIN para esse fim.

Verifica-se, ao longo da Minuta, a intenção da CVM de conferir maior flexibilidade às estruturas de FIDC, principalmente àquelas que sejam destinadas a um público de maior qualificação, o que pode contribuir para um maior desenvolvimento desse segmento do mercado.

 

[1] Processo Administrativo CVM n° 19957.003483/2020-85, julgado pelo Colegiado da CVM em 7 de julho de 2020 e Processo Administrativo CVM n° 19957.005955/2019-09, julgado pelo Colegiado da CVM em 30 de julho de 2019.

 

 

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