A CONSULTA PÚBLICA SDM Nº 01/2023 E A AMPLIAÇÃO DA PARTICIPAÇÃO EM ASSEMBLEIAS DE ACIONISTAS

A participação de acionistas em assembleias implica que aquele que desejar exercer o direito de se envolver nas decisões assembleares precisa assumir individualmente as despesas para tanto. Todavia, tais custos podem, por vezes, ser demasiadamente altos para os investidores, cabendo ao legislador introduzir mecanismos regulatórios capazes de mitigá-los em alguma medida.

Tendo isso em vista, a Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”), no dia 21/9/2023, deu início à Consulta Pública SDM nº 01/2023 (“Consulta”), que propõe alterações à Resolução CVM nº 81 (“Resolução 81”), a qual dispõe sobre assembleias de acionistas. Em suma, o grande propósito da CVM com as modificações na referida resolução é, nas palavras do presidente da autarquia, João Pedro Nascimento, “(…) promover maior engajamento e empoderamento dos acionistas, em especial, dos investidores de varejo”, com a redução dos custos para a participação nas assembleias.

Nessa linha, as alterações legislativas que estão sendo propostas procuram implementar, principalmente:

  1. obrigatoriedade de divulgação do boletim de voto à distância (“BVD”) para todas as assembleias de acionistas (gerais ou especiais, ordinárias ou extraordinárias), ressalvada hipótese de dispensa;
  2. aprimoramentos no conteúdo do BVD, sobretudo com relação à solicitação de instalação do Conselho Fiscal e à possibilidade de votar a respeito de propostas apresentadas durante a realização da assembleia e que não constavam na ordem do dia;
  3. simplificação do procedimento para transmissão das instruções de voto, a fim de que possam ser enviadas com menor antecedência da realização da assembleia;
  4. possibilidade de a companhia disponibilizar, além de sua sede, dois ou mais espaços físicos para participação em tempo real nas assembleias; e
  5. aperfeiçoamentos nos mapas de votação.

Como se observa no Edital da Consulta e na Análise de Impacto Regulatório (“AIR”), as motivações da CVM para alterar as regras de votação a distância em assembleias se fundam, acima de tudo, no fato de que a facilitação da participação nos conclaves almejada pela autarquia com a introdução do BVD em 2015 não foi plenamente alcançada. Como mostra a AIR, a quantidade de investidores não residentes no Brasil que efetivamente votam em assembleias apresentou, de 2018 para cá, um aumento bastante discreto, com um pequeno salto de 2.698 para 3.152 investidores[1].

Isso ocorre porque as companhias, em quase sua totalidade, somente disponibilizam o BVD nas assembleias em que o boletim é obrigatório. Como tais hipóteses constituem um número relativamente baixo de conclaves, muitos são aqueles em que o BVD não é oferecido aos acionistas. Consequentemente, investidores que não têm condições de assumir os custos envolvidos com a participação nas assembleias (como os acionistas minoritários, principalmente) ou que precisam assumir despesas extremamente elevadas para comparecer (caso dos acionistas não residentes), ficam, muitas vezes, praticamente impossibilitados de votar.

Tal estado de coisas não só faz com que as deliberações assembleares tomadas pelas companhias sejam menos representativas, como também constitui uma barreira, a diversos acionistas, ao exercício de um direito. Trata-se de uma situação que precisa ser ajustada, sendo necessária para tanto a alteração da Resolução 81, uma vez que tal norma não apresenta incentivos suficientes para que se veja algum tipo transformação do panorama atual.

Analisando as alterações mencionadas acima, não há dúvidas de que a disponibilização do BVD em todas as assembleias seja capaz de introduzir o incentivo necessário para a ampliação de seu uso. Na mesma direção, os aprimoramentos em seu conteúdo e a simplificação do procedimento para transmissão das instruções de voto (citados nos itens II e III acima) também tendem a ampliar a participação nas assembleias, na medida em que tornam o boletim um meio de votação mais robusto, útil e atrativo. Além disso, o oferecimento de diferentes espaços físicos para presença em assembleias (item IV) também deve facilitar a participação nos conclaves, posto que os acionistas passarão a ter mais opções de lugar para comparecimento presencial.

Assim, além de serem aparentemente benéficas para os investidores, a princípio as consequências dessas medidas não são especialmente onerosas paras as companhias. Conforme demonstrado na AIR, o valor desembolsado por uma companhia para disponibilizar o BVD em uma assembleia é de R$ 2.551,85[2] em média. Por outro lado, a AIR mostra que, para acionistas não residentes[3], os custos associados à participação de forma presencial ou digital em uma assembleia giram em torno de R$ 21.815,61 e R$ 21.381,45[4], respectivamente, ao passo que a votação via BVD demanda um gasto médio de R$ 2.707,53 para cada conclave.

Ante o exposto, parece provável que a reforma legislativa proposta por meio da Consulta tenha êxito em ampliar a participação nas assembleias de companhias abertas, sem implicar um aumento relevante de custos às companhias, o que aparenta ser benéfico para o cenário regulatório das companhias abertas. De todo modo, somente após a publicação da íntegra da nova versão da Resolução 81 e a implementação das novas regras pelas companhias será possível verificar se a reforma produzirá, de fato, um aumento significativo da participação de acionistas em assembleias.

 

[1] Tabela 1 da AIR.

[2] Tabela 2 da AIR.

[3] É explicado na página 23 da AIR o motivo da estimativa das possíveis reduções de custo por parte dos investidores ser feita com base nos gastos assumidos pelos investidores não residentes.

[4] Tabela 3 da AIR.

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