A cláusula de não concorrência em operações de fusões e aquisições

Nas operações de fusões e aquisições (M&A), a cláusula de concorrência desempenha um papel crucial na proteção dos interesses do investidor, garantindo a preservação do valor agregado do negócio adquirido e evitando que os sócios vendedores utilizem seu know how para criar ou atuar em negócio concorrente. Para que os termos dessa cláusula sejam eficazes e reduzam questionamentos futuros, é essencial que as partes considerem cuidadosamente não somente os negócios da sociedade adquirida, mas também os demais negócios em que os sócios vendedores eventualmente atuem.

Para a redação da cláusula de não concorrência, as partes da operação devem observar três principais limites: o temporal, territorial e o material.

Os dois primeiros referem-se, respectivamente, ao prazo pelo qual os sócios ficarão vinculados à obrigação e à área geográfica de abrangência, na qual os vendedores não poderão praticar as atividades concorrentes. Estes aspectos costumam ser razoavelmente mais objetivos, mas vale notar que as dificuldades de restringir os territórios vêm aumentando em função das facilidades geradas pela tecnologia e pela internacionalização do comércio e da prestação de serviços. Especialmente quando se fala de serviços passíveis de prestação online, abordar as restrições quanto à localidade do prestador, do consumidor do serviço ou mesmo do bem objeto do serviço, podem ser de relevante ajuda para fazer essa circunscrição.

O limite material, por sua vez, é representado pela definição das atividades e segmentos nos quais os vendedores não poderão atuar, participar ou investir. É crucial que, ao definir este escopo, as partes considerem não só os negócios diretamente desenvolvidos pela sociedade, mas também a participação dos vendedores em negócios paralelos ou futuros, no mesmo ramo de atividades da adquirida, ou mesmo, em casos de aquisições parciais de empresa por investidor estratégico, das atividades já existentes no grupo investidor no mesmo setor, caso em que os próprios vendedores, que permaneceram parcialmente no negócio, também terão interesse em proteger a empresa objeto da aquisição parcial.

Tal situação leva à necessidade de negociação com muita precisão de qual atividade estará sujeita à obrigação de não-competição, e uma antecipação de como será a vida comercial dos envolvidos logo depois do fechamento da transação, quais serviços cada parte prestará ou precisará na prestação de seus serviços, de modo a proteger, de um lado, os interesses dos envolvidos e, do outro, dar liberdade às partes para fazer aquilo que não for restrito sem gerar dúvidas. Às vezes, em casos de dificuldade de circunscrição da atividade, recorre-se inclusive a lista de clientes (atuais ou futuros) que estão fora dos limites de atuação de cada uma das partes para fazer a divisão. A negociação da não concorrência deve considerar, portanto, as nuances de cada negócio e eventuais exceções à obrigação, de modo que a cláusula siga com seu propósito de proteger o racional econômico-financeiro da operação ao mesmo tempo em que viabilize a continuidade dos demais negócios dos envolvidos, sob determinadas condições. A análise sob este viés evita, ainda, que a obrigação de não concorrência seja constituída já em descumprimento, em razão das atividades paralelamente exercidas.

A cláusula com restrições demasiadamente abrangentes pode acabar por engessar a atuação dos vendedores e de seus demais empreendimentos, ao não considerar particularidades decorrentes da natureza de cada um destes e dos negócios da sociedade adquirida.

Por outro lado, quando a definição de atividades concorrentes tem o escopo muito reduzido e sem pensar em seus desenvolvimentos futuros, a cláusula pode não oferecer a proteção necessária ao comprador contra práticas desleais.

Uma cláusula mal redigida e que não considere os pormenores acima pode gerar insegurança aos vendedores quanto aos limites de sua atuação em outros negócios pré-existentes, e exigir maior burocracia às partes, que entram em constantes comunicações para obter autorizações, reavaliar e renegociar termos dos documentos da operação, mesmo após sua celebração.

Portanto, é recomendável que para a redação da cláusula de não concorrência as partes considerem o mercado em que a sociedade e os demais negócios dos vendedores estão inseridos, os produtos e serviços oferecidos por cada um, os concorrentes diretos e indiretos, bem como os desdobramentos das atividades relacionadas a cada negócio. Quanto mais claros e detalhados forem os termos da cláusula de não concorrência, menor será a probabilidade de incertezas das partes e necessidade de renegociação dos termos.

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