Amortização de Ações da Lei das S.A.

A Lei n° 6.404/76, a Lei das Sociedades por Ações (“LSA”), assegura a todos os acionistas determinados direitos essenciais, que não podem ser afastados pelo estatuto social ou pela assembleia geral. Dentre eles, estão a participação nos lucros, a fiscalização dos negócios, a preferência para subscrição de ações, a retirada da sociedade e, o mais relevante para a presente discussão, a participação no acervo da companhia, em caso de liquidação (LSA, art. 109).

Quanto a este último, entende-se que, no caso de liquidação da companhia, depois de pagas todas as suas dívidas e seus credores, os haveres sociais deverão ser apurados e, se ainda restarem ativos, deverá haver um rateio entre todos os acionistas. Entretanto, a lei prevê uma possibilidade de antecipar eventuais valores a serem recebidos pelos acionistas na liquidação. Trata-se do instituto denominado de amortização de ações, o qual consiste na distribuição aos acionistas, a título de antecipação e sem redução do capital social, de quantias que lhes poderiam tocar em caso de liquidação da companhia (LSA, art. 44).

Para que as ações sejam amortizadas, a companhia deverá utilizar os lucros do exercício, as reservas estatutárias de lucros criadas para esse fim ou as reservas de capital. Em todo caso, deve haver uma disposição no estatuto ou deliberação em assembleia geral que preveja a possibilidade dessa operação, além de um lastro suficiente para que ela possa ocorrer. A doutrina entende que a reserva legal não poderá ser utilizada para a amortização de ações, haja vista que tal reserva tem por fim assegurar a integridade do capital social e poderá ser utilizada somente para compensar prejuízos ou aumentar o capital.

A amortização de ações pode abranger todas as classes de ações, só uma delas ou até mesmo parte de uma classe. Entretanto, caso a companhia decida por não abranger a totalidade das ações de uma mesma classe, a amortização deverá ser feita mediante sorteio. Tal disposição visa a garantia de uma posição equânime entre os acionistas da companhia, protegendo-os de um tratamento desigual pela companhia.

É importante ainda distinguir a amortização de outros institutos previstos na mesma seção da LSA: o resgate e o reembolso de ações (LSA, arts. 44 e 45, respectivamente).

O resgate consiste no pagamento aos acionistas do valor das suas ações para retirá-las definitivamente de circulação, com redução ou não do capital social. Caso seja mantido o capital após o resgate, será atribuído, quando for o caso, novo valor nominal às ações remanescentes. Este é um modo por meio do qual a companhia, com a anuência de, no mínimo, metade das ações da classe atingida em assembleia geral, pode extinguir determinadas ações em troca do pagamento de seu respectivo valor ao titular. Esse mecanismo, portanto, funciona como um instrumento para que a companhia reduza o seu número de ações, sem necessariamente diminuir o seu capital social. Também, caso previsto no estatuto social, a companhia pode prever ações resgatáveis, nas quais o acionista pode constranger a companhia a pagar o valor do resgate da ação, a critério do acionista. Nesse cenário, a criação de ações resgatáveis facilita a saída do acionista da companhia, com a manutenção do capital social.

O reembolso, por sua vez, é entendido como a operação pela qual, nos casos previstos em lei, a companhia paga aos acionistas dissidentes de deliberação da assembléia-geral o valor de suas ações. É a contrapartida recebida pelo acionista que exerce o seu direito de retirar-se da companhia, sendo obrigatório para a companhia a realização da recompra de tais ações. Diferentemente do resgate, no reembolso, as ações reembolsadas não são necessariamente canceladas, podendo ser mantidas em tesouraria.

Sendo assim, ao compararmos os três institutos, percebe-se que todos constituem hipóteses de exceção à vedação imposta às companhias, pela lei, de negociarem com as próprias ações (LSA, art. 30). Entretanto, como principal diferença, está o fato de que, tanto no resgaste quanto no reembolso, a menos que não atinjam a totalidade das suas ações, o acionista alvo do resgate ou do reembolso perderá a sua qualidade de acionista, diante do cancelamento da ação de sua titularidade ou da recompra pela companhia.

Adversamente, em todos os casos de amortização, o titular das ações sempre manterá a condição de acionista. Ao serem integralmente amortizadas, as ações de titularidade de um acionista poderão ser substituídas pelas chamadas ações de fruição, que conferem ao acionista todos os direitos que lhe conferiam as ações originais, como a participação nos lucros e a fiscalização da companhia, porém com certas restrições relacionadas à participação do acervo da companhia, em caso de liquidação, dado que esse direito já foi exercido antecipadamente. As ações de fruição só concorrem ao acervo líquido depois de assegurado às ações não amortizadas valor igual ao da amortização.

Desse modo, apesar de ser pouco utilizada na atualidade, a amortização é um instituto tradicional do direito societário e que ainda pode ser bastante útil para distribuir valores aos acionistas, que não os dividendos, sem que eles percam suas posições de acionistas da companhia. Um exemplo de sua utilidade prática pode ser visto na distribuição de valores aos acionistas titulares de ações gravadas com usufruto. Eventuais dividendos, por serem considerados frutos civis da ação, são destinados aos usufrutuários, contudo os valores dados em amortização caberiam diretamente ao acionista, dado que não são frutos, mas sim direitos decorrentes da própria ação.

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